sexta-feira, 4 de março de 2011

O meu lugar para debater minhas ideias contra outras ideias minhas!

 
            O tão aclamado avanço do regime democrático em proporcionar o debate de divergentes opiniões na esfera pública não passa de mais uma falácia daqueles que estão no controle da máquina do poder, também conhecida como instituições democráticas. Imaginar, como teorizou Habermas, que um sujeito pode problematizar uma afirmação e ao colocar novas afirmações atingir uma nova aceitação em relação à antiga afirmação, faz crer que o campo do debate seja um campo limpo ao uso daquilo que ele chama de razão comunicativa. É bem verdade que Habermas faz duas ressalvas a realização prática de sua posição teórica. Primeiramente, o sujeito esteja apto a produzir um discurso. Mas quem disse a George W. Bush, por exemplo, que ele estava apto? Em seguida menciona que os interlocutores não podem estar sujeitos a forças que impeçam o uso de sua razão comunicativa, entretanto tal observação não passa de uma comprovação de como filósofos acadêmicos geralmente se perdem na “floresta densa dos conceitos” como um mesmo compatriota de Habermas, que também se perdeu na floresta densa dos conceitos, argumentara décadas antes. A formulação de uma afirmação é livre para qualquer indivíduo, porém, a instituição que controla o debate, julga o conteúdo e se essa afirmação não coloca em dúvida a sua própria legitimidade. Considero isso bem claro, mas Habermas poderia afirmar que o debate democrático é para democratas, alegando que os não democratas, estes sim, utilizariam de forças cuja ação impederia o uso da razão comunicativa. Mas não é somente o uso da força para determinar os limites do debate, no regime democrático existe uma manobra de quem controla o espaço do debate em relação à efetiva participação com intuito de manter, ou aumentar, a própria força.
            Veja o caso da internet, onde o direito não conseguiu normatizar as ações dos indivíduos totalmente, apesar de toda ansiedade para que isso ocorra o mais breve possível. Ainda há críticos ferrenhos dos que controlam a máquina do poder, mas geralmente são “bons” meninos que crêem no chamado debate coletivo e abrem em seus poucos lugares de indignação um espaço para os leitores opinarem sobre seus argumentos apresentados. Em contrapartida, os que clamam a todo instante pela participação da chamada sociedade civil nos debates não crêem tanto nesse debate assim. Nem mencionarei a impossibilidade de argumentar contra as decisões tomadas pelo poder público e jurídico diretamente nas instituições que representam estes poderes, pois essa impossibilidade é demasiado claro. Mas em qual jornal poderíamos atacar um argumento utilizando-se do mesmo espaço que fora articulado, a fim de mostrar como o argumento é falho, sem consistência. O que o jornal nos oferece? Somente um espaço de reclamação na seção de correspondência cuja única utilidade é ser manuseado pelo ombudsman para dar credibilidade ao jornal. Em qual emissora de televisão poderíamos participar ao vivo e contra-argumentar o tempo necessário até o esgotamento das afirmações defendidas pela emissora. Garanto que não sobraria um Arnaldo Jabor! Ao Datena então, só restaria ser mendigo. Mas isso não ocorre e as pequenas críticas filtradas não passam de trampolim para os argumentos dos poderosos serem retrabalhados, revistos e reditos, dando a impressão de irrefutáveis.    
Irrefutabilidade que se esvai nos espaços com pretensões democráticas. A possibilidade de muitos falarem, falarem o quiser e do jeito que quiser traz a esses espaços eco dos discursos institucionalizados, confundindo o leitor e dificultando o entendimento do argumento de quem critica. Os conceitos e teses de quem argumenta são misturados, costurados e redefinidos a todo instante obscurecendo a interpretação, e o pior, como esses “bons” meninos não possuem uma equipe jurídica para defendê-los de ataques pessoais, covardes que se borram de medo de tecer ataques a uma família Mesquita, por exemplo, tornam-se críticos provocadores de quem critica uma instituição ou pessoa conceituada (conceituada geralmente por sua própria instituição ou braços dela). Talvez não seja somente covardia, mas a própria ação de ser uma pessoa crítica faz esses se sentirem como o regime democrático diz que um cidadão tem que ser. No fundo o regime democrático pouco difere dos regimes políticos autoritários, só é possível criticar quem não tem meios para impedir de ser criticado. No regime democrático esses meios não estão centralizados, de certa forma estão pulverizados em várias instituições, e consequentemente, controlados por mais pessoas, mas afirmar que estão bem distribuídos, ou que um dia ficará, não passa de uma grande mentira ou utopia. Já nos espaços que tentam efetivamente por em prática o ideal democrático ocorre um festival de argumentos sem consistência e ataques pessoais que no final atinge o seu verdadeiro objetivo, desqualificar aquele que critica, dando a impressão de que o argumento principal é totalmente falho. E o mais divertido é ver como aqueles que se preocuparam em abrir o debate a todos, no primeiro indício de falta de paciência com ataques de toda espécie, reagirem e serem tachados de antidemocráticos e até fascistas. Realmente! Democráticos são aqueles que controlam as instituições democráticas! Esses “bons” meninos são somente bobos que resolveram argumentar com aquilo que a democracia produz de melhor, gente sem cultura e com limitada capacidade argumentativa e interpretativa, mas com dois amplos direitos, além do óbvio direito de consumir, a de falar qualquer merda sem consequência ao seu status de cidadão. Os que controlam o regime democrático têm ideia de suas crias e não retira o status de cidadão de quem não decide porcaria nenhuma, pois sabe da utilidade estratégica desses nas manobras do jogo democrático, porém, limita a todo instante a participação efetiva, evitando o risco de desqualificação do próprio discurso por cidadões que realmente se assemelham ao Homer Simpson. Ou será que alguém considera que esta alcunha, dada pelo William Bonner ao seu telespectador, foi somente uma brincadeira?